sexta-feira, 17 de outubro de 2008

A igreja dos meus sonhos

Em um tópico da comunidade da Igreja Presbiteriana do Brasil no Orkut, alguém propôs que descrevêssemos as igrejas dos nossos sonhos. Tanto quanto à teologia, práticas litúrgicas e pastorais e até mesmo o tipo e número de pessoas que a freqüentariam.

Eis com o que me saí:

Denominação: Igreja Protestante Reformada do Brasil/Igreja Presbiteriana do Brasil

Confissão:
Belga/Helvetica Posterior

Orientação teológica:
Neo-ortodoxia barthiana

Arquitetura:
Gótica, românica ou neoclássica; templo em forma de cruz; o coro fica em um dos transeptos (os "braços"), o conjunto, no outro. No presbitério, apenas o púlpito, a Mesa, a Pia Batismal e a estante de leituras. Vitrais retratando passagens bíblicas. Uma cruz céltica prateada, com disco dourado, na parede. Acústica que dispensa microfonação. Anexo Administrativo, Edifício de Educação Religiosa e Casa Pastoral seguindo a mesma linha arquitetônica do templo.

Pastores:
Um só ministro, graduado em curso reconhecido pelo MEC e pós-graduado em curso reconhecido pela CAPES.

Membresia:
200 a 300 membros, de variadas faixas etárias e níveis sociais.

Liturgia:
Cristã histórica, com rito de entrada, penitência, liturgia da Palavra (todas as leituras do Lecionário, sermão preferencialmente baseado no Evangelho), liturgia eucarística (completa, com Grande Ação de Graças, toda semana) e ritos de intercessão e de envio.

Todo o serviço é dirigido de trás da Mesa, exceto pelas leituras, o sermão e a ministração do Sagrado Batismo.

Paramentação: para o ministro, toga genebrina preta, camisa clerical, peitilho (barrister tabs) e estola. Para presbíteros e diáconos (quando desempenharem função litúrgica), alba e estola do respectivo ofício. Mesa, púlpito e estante de leituras decorados na cor da respectiva estação (assim como as estolas). Sobre a Mesa, duas velas e uma estante para a Bíblia/ordem litúrgica.

Coro trajando sempre becas com acessórios nas cores litúrgicas apropriadas.

Costumes:
Dentro do templo, reverência absoluta. Templo ou capela anexa sempre abertos para visitação e oração durante a semana. Fora do templo, especialmente no salão social, descontração também absoluta.

Música:
No culto, estilos variados, desde o canto gregoriano até o pop-rock. As letras não podem jamais ser mantras repetitivos sem conteúdo; cada letra deve ser uma verdadeira aula de teologia em verso.

A igreja teria um Mestre-de-Capela, músico contratado, de formação superior, encarregado de todo o programa musical, acumulando as funções de Organista Titular, Regente Titular do Coro e Chefe de Departamento do Conjunto. Também seria de sua responsabilidade ministrar aulas de música aos interessados (subsidiadas em parte pela igreja, em parte pelos mesmos), mantendo sempre um bom número de músicos bem treinados entre os membros.

Fora dos horários de culto, uso do órgão e do templo para concertos. Uso do Auditório/Salão Social para outros eventos culturais, como cursos e espetáculos de dança, teatro e música contemporânea.

Instrumentos: Órgão de tubos (pequeno, 1500 a 2000 tubos no máximo, com dois manuais e pedaleira), piano, guitarra, baixo e bateria (estes últimos, com seus vocalistas, presos num aquário de acrílico isolado com captação, e o volume sempre no mínimo necessário para ouvir direito).

Escola Dominical: Com divisão etária até os adolescentes. Jovens e adultos em classes conjuntas, com opções de temas básicos, intermediários e avançados. Aulas sólidas, baseadas em pesquisa bibliográfica, nada de leitura de revista.

Perfil missionário: Ênfase em serviço social, educação e plantação sistemática de congregações. Rejeição ao modelo das megaigrejas.


Qual o sonho de vocês?

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Catedral Evangélica de São Paulo

Cumprindo uma promessa que eu fiz faz dois meses, vou relatar minha experiência na Primeira IPI de São Paulo, que é, senão administrativamente (ainda), ao menos afetiva e arquitetonicamente, a Catedral Evangélica de São Paulo.

Antes de falar sobre o culto que eu assisti por lá, alguns comentários sobre minha experiência com essa igreja, em geral. Fui pra lá participar do XX Seminário de Música Sacra da SOEMUS (no meu entendimento, a maior publicadora de música sacra do Brasil, não apenas entre os protestantes).

O Seminário, coordenado pela lenda viva, Rev. Mst.º João Wilson Faustini, divide-se em aulas, com variados módulos (regência coral básica e avançada, acompanhamento de coro e congregação para músicos, técnica vocal etc.), e também em prática coral. As aulas foram ministradas no monumental (senão pela arquitetura, que é bem International Style, ao menos pelo tamanho) Edifício Eduardo Carlos Pereira. À primeira vista, eu acreditava que, como ocorre na minha igreja, em Franca, o imóvel fosse um prédio comercial de propriedade da igreja e alugado a diversos escritórios, servindo como fonte de renda. Qual não foi minha surpresa ao saber que não, que todos os trabalhos desenvolvidos no ECP são da própria igreja, incluindo uma escola de música com uma impressionante orquestra. E isso reflete diretamente na qualidade da música litúrgica da Catedral. Mais sobre isso adiante.

Eu disse que a Catedral ainda não é a sede administrativa da IPI em São Paulo; existem planos (não sei se já implementados) para se centralizar a administração do Presbitério de São Paulo no alto do ECP. Se isso não tornar a Primeira IPI em uma Catedral de pleno direito, não sei o que mais tornaria!

O ECP ainda abriga a Capela da Catedral, um pequeno e simpático (embora exageradamente zwingliano) santuário. Mesa central, púlpito lateral, um órgão eletrônico (litúrgico, com pedaleiras e manuais completos, nada dessas coisinhas que a gente é obrigado a tocar no interior) e um piano. Queria ter tirado uma foto da capela, mas não pude por falta de tempo.

Também de interesse para mim foi o salão social da Catedral. Não sei se é o caso, mas ele tem exatamente a cara de (conforme o costume presbiteriano) ter servido como templo antes da construção do próprio. Portas e janelas em arco ogival, motivos decorativos em gesso e cimento, janelas em vidro colorido. Por dentro, uma galeria atrás e uma plataforma elevada na frente, que certamente se presta como coro/presbitério. Logo abaixo dele, um piano meia-cauda, que acusa sua idade com orgulho. O salão me pareceu pequeno para o tamanho da congregação da Catedral, mas aparentemente, não é mesmo costume dos nativos ficar de papo e cafezinho depois do culto. Por motivos óbvios que eu vou narrar adiante.

Entre o ECP e o salão, uma quadra poliesportiva relativamente bem conservada, embora carente de uma arquibancada. Não me parece ser usada com freqüência, também.

O templo em si é impressionante, a começar pelo tamanho. É o maior templo protestante que eu conheço (megaigrejas pentecostais não contam, primeiro porque não são protestantes, e segundo, porque não são construídas como templos, e sim como auditórios).

Estilisticamente, o prédio imita o estilo gótico francês por fora. Imita, porque, afinal, ele é construído em tijolo, cimento, ferro e concreto; os elementos decorativos são enchimento de gesso e cimento. Não que isso seja um demérito, ao contrário, no Brasil, qualquer inclinação arquitetônica de uma igreja protestante a um estilo apropriadamente religioso só pode ser louvada! E tudo pintado de um branco impecável (a foto acima é antiga; eu fui logo depois da conclusão de uma reforma geral).

Internamente, o nártex (hall de entrada) é impecavelmente gótico, com o teto em abóbadas ogivais. Na nave, encontramos uma marca que é muito mais patente no gótico inglês: um teto reto de madeira trabalhada, envernizada (laqueada, talvez) e bem polida.

O prédio segue o esquema geral de construção em cruz, em três camadas verticais; nível do chão, trifório e clerestório. No nível do chão, encontramos janelas altas. No trifório, uma galeria que começa na área sobre o hall de entrada e estende-se sobre as laterais da nave, tomando também os transeptos. E janelas no clerestório.

Exceto por algumas janelas de vidro transparente na galeria, todas as demais são belos vitrais com motivos florais (certamente uma concessão da época aos pendores puritânicos comuns em São Paulo -- e todos sabemos como os puritanos abominam arte figurativa, mesmo que seja de passagens e personagens bíblicos...).


Curiosamente, os vitrais podem ser abertos, ajudando na ventilação do lugar. Não que costumem ser necessários; a combinação de pé-direito alto e revestimentos de pedra lisa ajuda a manter uma temperatura constante e agradavelmente fria.

O Presbitério é elevado em quatro degraus (será que é pra evitar o três, comum nas igrejas romanas, ou é pra facilitar a vista do povo?). Nele, temos o púlpito do lado esquerdo (tenho fotos antigas da Catedral em que ele ficava na posição central comum às igrejas puritanas). No centro, a Mesa do Senhor com um número absurdamente grande de cadeiras. Ao fundo, na ábside, a jóia da Catedral: um órgão Austin (Opus 353) de ação eletropneumática, de 1911. Dois manuais de cinco oitavas e uma pedaleira completa. Não anotei as especificações de registração, mas a organista me fez notar que não há registros de 32 pés, apenas alguns de 16 no Grande e na pedaleira (e mesmo esses, para caber, são curvos). Mais detalhes podem ser vistos no site da Catedral.

Bom, sobre o culto da Catedral. Vou seguir o esquema dos relatórios do Mystery Worshipper, do site Ship of Fools, embora eu fosse tudo menos anônimo nesse culto.

O boletim desse domingo, com a liturgia, pode ser encontrado aqui.

A Igreja: Catedral Evangélica de São Paulo (Primeira Igreja Presbiteriana Independente)
Denominação: Igreja Presbiteriana Independente do Brasil
A vizinhança: A Catedral fica no "canto leste" da Consolação, em São Paulo, perto da Praça da República (e respectiva estação do Metrô).
Elenco: Revs. Abival Pires da Silveira, Elizeu Rodrigues Cremm e Valdinei Aparecido Ferreira, além de duas simpáticas diaconisas e alguns presbíteros.
Dia e hora: Domingo, 31 de agosto de 2008, 10h45.

Qual foi o nome do culto?
Culto das 10h45, 22.º Domingo do Tempo Comum. Era, também, pelo calendário presbiteriano, o Dia do Pastor, o que causou uma confusão engraçada: os paramentos do templo eram verdes, mas os ministros estavam de estolas brancas!

Quão cheio estava o prédio?
A nave estava cerca de 70% ocupada. A galeria geralmente só é aberta para cultos especiais.

Alguém lhe cumprimentou pessoalmente?
Eu estava acompanhado de um dos presbíteros da igreja, que me apresentou a um monte de gente e aproveitou para fazer propaganda deste blog...

Seu banco estava confortável?
Tanto quanto se espera de um banco de igreja com assento em madeira, sim.

Como você descreveria o ambiente antes do culto?
Nós chegamos em cima da hora, mas as pessoas pareciam chegar aos seus lugares, cumprimentando e conversando pouco e baixo com quem encontravam.

Quais foram, exatamente, as palavras iniciais do culto?
Conforme o boletim, foi o intróito Povo Santo, de M. A. Campra, arranjo e versão brasileira de J. W. Faustini. Seguiu-se uma oração doxológica extemporânea pelo Rev. Abival.

Quais livros foram usados pela congregação?
A Bíblia mais comumente usada no presbiterianismo brasileiro é a Almeida, Revista e Atualizada, da qual havia vários exemplares nos bancos. A IPIB usa seu hinário oficial, Cantai todos os povos, mas as letras de todos os hinos estavam no boletim.

Que instrumentos musicais foram utilizados?
Órgão de tubos e orquestra (formação sinfônica tradicional).

Alguma coisa o distraiu durante o culto?
Meu hiperativo anfitrião fazia comentários constantes sobre a qualidade da liturgia e o andamento do culto. Em geral, bastante engraçados.

O culto foi engessado, saltitante, ou o quê?
Seminaristas e detratores em geral chamam o culto da Catedral de "missa". Certamente é a liturgia presbiteriana mais elaborada da cidade de São Paulo, bastante formal. Mas fluiu naturalmente, sem a teatralidade que trai quem "não é, mas tenta ser" litúrgico.

Qual foi a duração do sermão?
Coisa de uma meia hora.

Em uma escala de 1 a 10, qual a nota do pregador?
7; A mensagem foi teologicamente sólida, mas eu não sou exatamente um fã de alegorias na pregação.


Em suma, sobre o quê foi o sermão?
Nós devemos ter na Palavra de Deus a nossa segurança, assim como o alpinista põe a sua nos grampos cravados na rocha.

Que parte do culto foi como estar no céu?

O simples fato de poder participar de um verdadeiro culto high church foi o ponto alto do meu mês, quiçá do meu ano. A organista manda muitíssimo bem, e a seleção musical do dia foi excelente. Poder cantar um dos antemas com o coro foi muito legal, também.


E qual parte foi como estar... tipo... no outro lugar?
Eu realmente não gosto de sermões alegóricos. Foi o único ponto negativo.

O que aconteceu quando você ficou lá com cara de perdido?
Meu anfitrião não deixou isso acontecer... Ainda me conseguiu dois números da revista oficial da Catedral, com bons artigos sobre história e teologia. Minha viagem de volta para Franca foi bastante instrutiva!

Como você descreveria o café depois do culto?
A Catedral parece não ter esse costume, visto que o culto das 10h45 acaba por volta da 1 da tarde... Todo mundo volta correndo pra casa ou pro restaurante mais próximo. Eu corri pra filial mais próxima da tradicional Padaria Sta. Efigênia, já que tinha um ônibus pra pegar mais tarde.

Como você se sentiria em fazer dela a sua igreja, de 0 a 10?
10! Se eu morasse em São Paulo, talvez apenas a Igreja Luterana fosse um páreo duro para a Catedral.

O culto lhe fez sentir-se feliz em ser cristão?
Com certeza!

Diga uma coisa da qual você certamente vai se lembrar ao longo da semana.
O som do órgão de tubos. Aquele final de semana foi, afinal, minha primeira vez ouvindo um!