quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Monges em oração

Rev. Dan Baumgartner

Monks at prayer originalmente publicado em Bethany Briefs, órgão oficial da Bethany Presbyterian Church, Seattle, Washington, EUA, em setembro de 2008. Todos os direitos reservados ao autor.

Em junho, participei de um seminário chamado "Writing and the Pastoral Life" ["O escrever e a vida pastoral"], com Eugene Peterson. Foi sediado em Collegeville, Minnesota, lar da Universidade e Abadia Beneditina de São João, e me provocou a refletir um bocado sobre o que é seguir Jesus a longo prazo.



Entrei no templo da Abadia de S. João para a Oração Vespertina. O prédio é um monumento à arquitetura modernista dos anos 1960 e seu uso maciço de concreto. Alguns outros entram após mim, todos dirigidos a assentos na área do coro, bem na dianteira daquele cavernoso templo. Logo todos se põem de pé, e cerca de cinquenta monges entram em fila, um desfile de pinguins de hábito preto que se encerra com todos eles também perfilados ao redor do altar.

Depois que nos acomodamos, e que eu organizei os livros certos na minha frente, passei a estudar com cuidado cada um daqueles homens. Como é de se imaginar, a maioria está envelhecendo. Carecas lustrosas e cabelos branquíssimos adornam o alto de quase todos os hábitos negros. Um é descendente de africanos. Outro tem os cabelos e barba tão compridos que deixariam Pai Abraão orgulhoso. Outro tem longas suíças grisalhas. Outro não tem mais que um metro e meio, enquanto o colega ao lado mede quase dois.

No espaço silencioso, eu invento estórias. Aquele monge é da Etiópia, e vive se perguntando como, por Deus, ele foi parar na tundra de Minnesota. Será que pegou alguma entrada errada? O outro é do Kansas, e vem de uma família de cinco filhos. Seus três irmãos raramente pensam nele enquanto trabalham na fazenda, sua irmã o visita com frequência e o ama até o fim, mas teme que ele esteja deixando a vida passar.

Minha narrativa fictícia é interrompida quando Quase-Dois marcha para a frente do presbitério e acende o incenso. Entoamos versos bíblicos. "Suba à tua presença a minha oração como incenso, ó Senhor" (Salmo 141). Uma enorme e violenta nuvem sobe como a coluna que os israelitas seguiram no deserto. Ela diminui, desacelera, se acumula em ondas ao redor do grande crucifixo sobre o altar. Suba à tua presença a minha oração como incenso, ó Senhor.

Fico a pensar sobre a vida cotidiana desses cinquenta monges. Imagino qual será a sensação de saber como será a maioria dos seus anos, até a sua morte. Imagino onde vão para fazer seus exames de vista e de audição, onde vão para aferir a pressão.

A névoa de incenso já quase se acabou, uma leve nuvem agora paira sobre nós, embora o aroma esteja mais forte. Sairemos indelevelmente marcados pelos traços acres no ar. Suba à tua presença a minha oração como incenso, ó Senhor.

Olho de soslaio para o monge sentado ao meu lado. Ele não precisa dos livros. Ele sabe as melodias, as letras e as pausas. Os beneditinos fazem uma pequena pausa no começo de cada versículo, segurando um pouco mais o ar e fazendo mais de um visitante começar a primeira palavra em solo. O transgressor, então, acabrunhado, apenas dubla os próximos versículos para ter certeza de não errar mais. Gosto disso. Nos mantém em alerta. Esses monges não têm pressa.

Imagino como será observar as Horas de oração, matutina, do meio-dia e vespertina. Aspirar o incenso e ler o Evangelho enquanto as folhas secas do outono fazem o barulho de papel amassado quando se pisa nelas. Orar os Salmos quando a neve transforma os prédios de tijolinho à vista do campus em uma paisagem de cartão de Natal. Recitar o Pai Nosso enquanto a primavera explode num resplendor de verde. Entoar as orações quando o sol do verão aquece os sinos lá fora a ponto de se poder fritar um ovo neles. Dia após dia, semana após semana, mês após mês, ano após ano, até que as décadas e vidas inteiras se esvaiam. Suba à tua presença a minha oração como incenso, ó Senhor.

Confesso minhas dúvidas. Por certo que essa vida monástica, tão diferente da minha, não é o meio mais eficaz de se viver o Evangelho. O mundo se esvai em necessidades concretas, e o Senhor precisa de cada mão capaz. Não será isso mais do que um escapismo maldisfarçado de santidade?

Mas as orações subiram - outono, inverno, primavera, verão - três vezes por dia desde 1866 neste lugar. Cento e quarenta e dois anos de orações. Em paz e em guerra, em depressões e em tempos de boom econômico, ao longo de revoluções industriais, corridas espaciais e explosões tecnológicas, esteve uma comunidade em uma colina em uma capela da abadia, orando. Sempre orando.

Como se mede a eficácia de algo assim? Com tudo o que tem dado errado no mundo nesses anos, talvez esta vida de oração tenha sido totalmente impotente. Ou (e é isso que me intriga), como estaria o mundo se essa constante bateria de orações não tivesse sido entregue no colo de Deus? Talvez, sem monges altos, baixos, magros e gordinhos orando em S. João e outros lugares, ao longo de tantas gerações, o mundo já teria se arruinado muito tempo atrás. Suba à tua presença a minha oração como incenso, ó Senhor.

A Oração acaba, os monges-pinguins marcham para fora. Ao sair, mergulho a mão na pia batismal e empurro as enormes portas de madeira. Soam os sinos e sinto uma leve nota de incenso deixar
minha própria roupa, rumo ao crepúsculo.
Abadia de S. João ao entardecer. Foto: Rosemary Washington.

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